A epidemia de cólera em Angola tem assumido proporções alarmantes, atingindo agora 18 das 21 províncias do país. O mais recente foco surgiu na província da Lunda Norte, concretamente no município do Cafunfo, com 24 casos confirmados e uma morte apenas no último fim de semana. O cenário agrava-se com centenas de amostras suspeitas ainda em análise laboratorial, o que indica que o número real de infetados poderá ser significativamente superior ao reportado.

Desde 7 de janeiro, a cólera já provocou 609 mortes em Angola, com um total de 19.605 casos registados. Luanda, epicentro da epidemia, contabiliza 6.285 infeções e 208 óbitos. Estes números, por si só, seriam motivo suficiente para uma mobilização nacional sem precedentes. No entanto, o que se tem assistido é uma resposta governamental lenta, descoordenada e, em muitos casos, ausente.

É inadmissível que, em pleno século XXI, uma doença altamente prevenível e tratável continue a ceifar vidas em Angola devido à crónica falta de investimento em saneamento básico, abastecimento de água potável e educação sanitária. O aparecimento de casos na Lunda Norte — uma província já duramente marcada por carências estruturais e negligência institucional — simboliza o falhanço do Estado em garantir o mínimo de condições de saúde pública aos seus cidadãos.

O Ministério da Saúde apela agora à população para adotar medidas preventivas. Mas como fazê-lo em comunidades sem acesso a água limpa ou serviços de saúde adequados?

A cólera não é apenas uma crise sanitária: é o espelho de décadas de má governação e desprezo pelo bem-estar da população. Enquanto não houver responsabilização e vontade política real para atacar as causas estruturais da doença, o país continuará a enterrar vítimas de uma tragédia evitável.