A Itália acolheu uma cimeira de líderes africanos onde a primeira-ministra Giorgia Meloni apelou a uma “nova página” nas relações com o continente, centrada na energia e no fim da migração através do Mediterrâneo.

Meloni, que chegou ao poder em 2022 com um discurso anti-migrante, revelou um plano para África muito badalado, centrado numa abordagem “não predatória” inspirada em Enrico Mattei, o fundador do gigante energético estatal italiano Eni, no pós-guerra.

O chamado Plano Mattei espera colocar a Itália como uma ponte fundamental entre África e a Europa, canalizando energia para o norte e trocando investimentos no sul por acordos destinados a travar a migração.

Meloni disse que o plano seria inicialmente financiado com 5,9 mil milhões de dólares, alguns dos quais seriam empréstimos, com investimentos centrados na energia, agricultura, água, saúde e educação.

Representantes de mais de 25 países participaram na cimeira realizada no Senado italiano – denominada “Uma ponte para o crescimento comum” – juntamente com a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e representantes das agências das Nações Unidas e do Banco Mundial.

Meloni afirmou que os “destinos” da Europa e de África estão interligados e que está determinada a cooperar “de igual para igual, longe de qualquer tentação predatória, mas também da abordagem caritativa de África que é inadequada ao seu extraordinário potencial de desenvolvimento”.

A Itália, antiga potência colonial na Líbia, na Etiópia, na Eritreia e na atual Somália, quer trabalhar com as nações africanas para “escrever em conjunto uma nova página nas nossas relações”, afirmou.

Entre os convidados esteve o Presidente da Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat. Faki disse que África estava “disposta a discutir o conteúdo e a implementação” do plano, mas afirmou que “gostaríamos de ter sido consultados previamente”. Faki acrescentou que pretende passar “das palavras aos actos” e que não basta fazer “promessas que muitas vezes não são cumpridas”.

Roma assume este ano a presidência do grupo de nações do G7 e prometeu fazer do desenvolvimento africano um tema central, em parte para aumentar a sua influência num continente onde potências como a China, a Rússia, a Índia, o Japão e a Turquia têm vindo a aumentar o seu peso político.

A cimeira surge poucos meses depois de a Rússia ter realizado a sua própria cimeira com líderes africanos e de outros países, incluindo a China e a França, terem realizado iniciativas semelhantes.

Meloni disse que o plano italiano começaria com uma série de projectos-piloto – desde a modernização da produção de cereais no Egipto à purificação da água na Etiópia e à formação em energias renováveis em Marrocos – com o objetivo de os alargar a todo o continente.

Von der Leyen descreveu o plano como “complementar” ao próprio pacote da União Europeia para África, apresentado em 2022 e no valor de 150 mil milhões de euros.

Meloni quer transformar a Itália numa porta de entrada para a energia, aproveitando a procura dos outros países europeus que procuram reduzir a sua dependência do gás russo após a invasão da Ucrânia por Moscovo em fevereiro de 2022.

Os críticos afirmam que o plano parece estar demasiado centrado nos combustíveis fósseis e apelam, em vez disso, a um esforço no domínio das energias renováveis para satisfazer as necessidades dos mais de 40% de africanos que não têm qualquer acesso à energia.

O plano de Roma consiste em trocar investimentos em energia por esforços para travar a migração. Meloni prometeu parar os barcos de migrantes do Norte de África.

Mas os desembarques em Itália aumentaram, de facto, desde a sua eleição, para quase 158.000 no ano passado, contra cerca de 105.000 em 2022.

O Mediterrâneo Central, entre o Norte de África e Itália, é a travessia de migrantes mais mortífera do mundo. Cerca de 100 pessoas morreram ou desapareceram no Mediterrâneo Central e Oriental desde o início do ano, segundo a Organização Internacional para as Migrações. O número é mais do que o dobro do valor registado no mesmo período de 2023, o ano mais mortífero para os migrantes no mar na Europa desde 2016, segundo a organização.

O Plano Mattei pretende combater os chamados factores de repulsão e persuadir os países de origem a assinar acordos de readmissão para os migrantes a quem foi recusada autorização para permanecer em Itália.