Por estes dias corre em São Petersburgo uma cimeira Rússia-África, presidida por Vladimir Putin. Vários chefes de Estado africanos acorreram ao chamamento russo e abraçaram-se a Putin em fotografias encenadas à sua chegada, destacando-se o Presidente da África do Sul, e de Moçambique.
Angola enviou apenas o ministro dos Negócios Estrangeiros. Fez bem. Na realidade, esta cimeira é um fiasco para Putin, apesar das fotos. Apenas 17 Chefes de Estado compareceram dentre os 49 convidados, cerca de metade dos que tinham ido a anterior chamada. Figuras relevantes como o Presidente do Quénia não compareceram, e Cabo Verde, tido como um dos modelos democráticos em África, não mandou qualquer delegação.
Os países não têm aliados eternos, mas interesses eternos, disse no século XIX Lord Palmerston, e isso aplica-se claramente à relação entre Angola e Rússia.
O apoio dado pela Rússia nos anos 1980s teve um papel fundamental para Angola, mas obedeceu essencialmente aos interesses russos na Guerra Fria. Desde aí, as relações que têm existido não têm tido especial importância para o desenvolvimento de Angola. Na verdade, tirando aspetos ligados ao armamento, aos diamantes e a alguma finança, a influência russa em Angola diminuiu drasticamente após o final da Guerra Fria.
A isto acresce que a posição que a Rússia de Putin tem estado a estabelecer em África é essencialmente depredadora de recursos e desestabilizadora. Neste momento, tenta estabelecer um cinturão vermelho no Sahel que perturbará, ainda mais, os precários equilíbrios africanos. Nessa medida, o papel de Angola, salvaguardando a velha amizade, não pode ser de alinhamento com a Rússia, mas de alinhamento com África, em especial com a estabilidade constitucional e o desenvolvimento sustentado, algo que os russos com as suas operações Wagner e demais promoção de conflitos não promovem.
Não vale a pena falar nas ofertas de cereais anunciadas de Putin que terão um preço bem caro, sendo uma benesse que Angola não beneficie. Neste momento, atendendo à situação político-militar em que a Rússia se encontra não há “almoços grátis”, mas ofertas com contrapartidas que Angola nunca poderia assegurar.
E do ponto de vista interno, João Lourenço ao não alinhar com a Rússia coloca a UNITA, que tem andado ativa nos Estados Unidos, perante um dilema. Vai criticar o não alinhamento angolano com a Rússia, distanciando-se dos EUA? Ou vai concordar com João Lourenço?